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domingo, 8 de agosto de 2010

(Re)nasce uma estrela


São Paulo, domingo, 08 de agosto de 2010



Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

(Re)nasce uma estrela
Carlos Cecconello/Folhapress

O cantor Edy Star, 72, na loja de discos Baratos Afins, na Galeria do Rock, que chama de "segunda casa"

De volta ao Brasil depois de 18 anos, nos quais "sobreviveu" graças a um "puteiro internacional", o cantor Edy Star relembra o passado de histórias e parcerias com Raul Seixas, Gilberto Gil e Jorge Amado

"Mas a reportagem é sobre mim mesmo, né? Não aguento mais jornalista perguntar tudo da minha vida e, quando a matéria sai, o enfoque é em Raul Seixas e eu viro coadjuvante", diz Edy Star ao repórter Marcus Preto.



Figura mitológica do underground musical brasileiro, ele é cultuado pelos fãs de Raul por sua participação no LP "Sociedade da Grã-Ordem Kavernista Apresenta Sessão das 10", de 1971. Ali, Edy e Raul dividiam espaço com os estreantes Sérgio Sampaio e Miriam Batucada. Foi fiasco total de vendas, mas ganhou, com o tempo, a aura de "clássico incompreendido" do rock nacional.


Baiano de Juazeiro, Edivaldo Souza era produtor de musicais na TV Itapuã, em Salvador, antes de pegar o ônibus (pago por Raul) de mudança para o Rio. Foi demitido porque cobrou, no ar, salários atrasados: "Tem quatro meses que não recebo! Quero meu dinheiro!" Saiu de lá e meia hora depois encontrou Raul, seu amigo, no centro de Salvador. "Eu estava te procurando!", disse o maluco beleza, então produtor da gravadora CBS. Ele queria gravar um disco coletivo. Convidou Edy.


Conheceu Caetano Veloso em 1959, andando por Santo Amaro da Purificação, na Bahia. "Vi um casarão com as portas abertas e um menino tocando piano. Era ele. Ficamos amigos."


"Procissão", canção de Gilberto Gil lançada em seu primeiro LP, de 1967, tem versos de Edy. "Desculpe, mas 50% da letra é minha. Nunca cobrei nada -nem ele negou que eu fosse coautor. Até que precisei de dinheiro. Há três anos, pedi minha parte. Quanto ganhei? Não digo."


"Bethânia pra mim é uma santa, querido. Ela está acima do bem e do mal. Quando faço fotos com ela, me abaixo -não posso estar na mesma altura que minha santa. Não posso vê-la que me ajoelho imediatamente."


O sobrenome Star surgiu nos cabarés da praça Mauá, no Rio, onde Edivaldo -já Edy- começou a se apresentar nos primeiros anos da temporada carioca. "Eram shows muito avançados para aquele período de ditadura. As cenas eram sexuais, tinha lesbianismo e até um anão que corria nu pela plateia."


Edy fazia seu show performático, derivado do teatro de revista. Cantava com visual andrógino e corpo purpurinado. "Quando o pessoal do "Pasquim" apareceu por lá, tudo mudou", diz. "Jaguar, Millôr, Paulo Francis... eles adoraram o espetáculo, escreveram que a melhor coisa do Rio era a praça Mauá e a grã-finada passou a frequentar. Tinha dia que a boate já abria toda reservada. Tinham que botar as putas pra fora para caber o pessoal da sociedade com as esposas."


Foi em uma dessas sessões que João Araújo, pai de Cazuza e então presidente da gravadora Som Livre, convidou o performer a gravar o primeiro disco solo pela empresa. "Sweet Edy" saiu em 1974 com inéditas de Caetano, Gil, Roberto e Erasmo. Todas elas especialmente compostas para Edy Star.


"Eu já conhecia essa gente toda da Bahia. Gonzaguinha também me deu uma inédita. Não entrou no disco, porque a censura implicou com uma rima. [Luiz] Melodia fez outra que chegou tarde demais." O encarte do LP trazia depoimentos de celebridades. Caetano, Gil, Nara Leão, Lennie Dale, Susana Vieira, Rogéria, Darlene Glória, Fernando Sabino, Nelson Motta e Ricardo Amaral, entre outros, teciam altos elogios ao artista que "nascia". Roberto Carlos escreveu: "Bicho, eu parei na de Edy Star!". Jorge Amado foi mais longe: "Guardem seu nome, não tardará que seja repetido e consagrado". Edy conheceu o escritor nos anos 60, quando fazia performance em uma galeria. "Também sou pintor, e Jorge escreveu o catálogo da minha exposição. Tenho a carta batida à máquina com os erros de português que depois Zélia [Gattai] corrigiu à caneta. Guardo tudo sobre mim para mostrar a quem duvidar."


"Sweet Edy" também não fez sucesso. "O disco não saiu com a cara do meu show. Era tudo muito limpo, muito TV Globo. Detestei." Foi convidado, em 1975, a integrar o elenco da montagem brasileira de "Rock Horror Show", que estreou no Teatro da Praia, no Rio. Lucélia Santos era a estrela. "Ela era uma criança. Ria muito. Aliás, naquele tempo, todo mundo queimava um fuminho e ria de tudo."


Na sequência, Edy voltou a fazer teatro de revista. No meio dos anos 1980, foi convidado por Guilherme Araújo para cantar nos bailes de Carnaval do Gala Gay. Quem fazia o coro eram os filhos de Martinho da Vila, incluindo a ainda adolescente Mart'nália. "Sempre fui chamado de "viado" e nunca me ofendi. A palavra "gay" é uma merda. É muito bom como literatura ou pra descrever esses saradinhos que se vestem com a última moda. O que faço não é coisa de gay. É bichice, mesmo. É viadagem."


Em 1992, quando as boates já não tinham mais conjunto, Edy se mudou para a Espanha. "Sobreviveu" no país, segundo diz, trabalhando numa casa "de garotas". "Na internet, disseram que eu tinha virado travesti. Não é nada disso. Trabalhava em um puteiro internacional, com 35 mulheres. Toda noite, aconteciam 18 stripteases. Eu entrava entre um número e outro pros clientes descansarem o olho de tanta "xoxota"."


A decisão de voltar ao Brasil veio no ano passado, graças ao sucesso do show que Edy fez na Virada Cultural de SP. Comemorando os 20 anos de morte de Raul, ele apresentou, na íntegra, as canções de "Sessão das 10". O sucesso absoluto fez com que ele tivesse que refazer o espetáculo neste ano.


Edy mora hoje em um hotel no centro de SP, em frente à Galeria do Rock. Com 72 anos, namora um jovem de 18 no Brasil. E um romano de 26 na Espanha. "Íamos casar no papel quando decidi morar no Brasil. Vou voltar lá [na Espanha], passar uns 15 dias e conversar com ele. Casamento, só quando isso for permitido aqui no meu país."

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